sexta-feira, abril 21

Problema de Dilaram: “Sacrifica as torres e não a mim


A estória que hoje vos trago, vem lá de trás. De um tempo em que não havia telemóvel, nem automóvel, nem jornais e nem sequer existia um país chamado Portugal.
Problema de Dilaram, com a representação das peças de Afonso X | Créditos CPC
A resolução de problemas de xadrez, foi desde sempre uma forma de treinar determinadas técnicas e o desenvolvimento do raciocínio lógico. Porém quando a palavra escrita era escassa (os livros eram raros), a tradição oral era o principal meio de difusão de ideias. Uma boa estória jamais era esquecida, embora aqui e ali alguns pormenores se fossem alterando. 

Esta estória envolve um príncipe persa, algures no nono século. Este príncipe era um amante do xadrez, habituado a ganhar e apostar na sua vitória. Certa vez o príncipe defrontou um nobre que estava de passagem. Este nobre, era um forte jogador de xadrez, e por tal a sorte do príncipe tomou um rumo totalmente desfavorável. O príncipe teve enormes perdas, porém não estava convencido da superioridade do nobre. No derradeiro jogo, o príncipe já despojado de todos os seus bens decide jogar a sua amada Dilaram (nome que significa a alegria do coração). Como seria de esperar, esta partida foi totalmente desfavorável aos interesses do príncipe, o qual chegou à situação desesperada mostrada no diagrama acima, em que o nobre ameaçava mate em uma jogada. 
 
Desenho da artista russa Ludmila Gavrilova que ilustra o problema de Dilaram
Nessa altura, Dilaram desesperada, não se conseguindo conter mais grita para o seu amado: “Sacrifica as torres e não a mim”. E conta a estória que o príncipe, com esta sábia sugestão recuperou os seus bens e manteve a favorita das suas esposas. A sequência de jogada foi: 1. Th8+ Rxh8 2. Bf5+ [no xadrez árabe e no medieval europeu o Bispo, então designado por Alfil (que significa elefante) andava duas casas na diagonal, podendo nesse movimento passar sobre qualquer outra peça] Rg8 3. Th8+ Rh8 4. g7+ Rg8 5. Ch6#.

O problema de Dilaram é atribuída a as-Suli [Abu Bakr Mohamed ibn Yahya al-Suli (880-946)], que foi jogador e escritor islâmico da corte do Califado de Bagdad. Trata-se de uma posição clássica, que por isso aparece com ligeiras variantes em todos os livros de xadrez árabe, e posteriormente em muitas composições do xadrez medieval europeu. 

Curiosamente, no livro de jogos de Afonso X, de 1283, aparecem 4 problemas correlacionados com o problema de Dilaram. Deixamos abaixo as imagens destes 4 problemas, retirados da obra “O Livro de Jogos de Afonso X, o Sábio” de Jorge Nuno Silva. Agradecemos ao autor a autorização dada para esta reprodução.


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