sexta-feira, abril 28

Xadrez da resistência antifacista portuguesa


Por volta do ano de 1985, estando há cerca de 2 anos no concelho de Torres Novas, onde realizei o ensino secundário, participei com diversos amigos - António Alves, Vitor Antunes (ambos ainda jogadores regulares), e outros - na criação do Grupo de Xadrez de Torres Novas. Este clube teve como padrinho Canais Rocha o director do jornal local - O Almonda. 

Peça de xadrez feita de miolo de pão do filme alemão Schachnovelle

Esta nova colectividade, não dispondo de espaço próprio ocupou provisoriamente um espaço partilhado por diversos partidos políticos, e pela Associação Portugal-URSS. Após um ano, mudamos de instalações para o velho quartel dos bombeiros. O Grupo de Xadrez de Torres Novas participou activamente nas provas distritais, fazendo deslocações aos concelhos vizinhos e outros. Uma das deslocações que mais memória me deixou foi em equipa até à distante freguesia do Couço, bem a sul do distrito de Santarém. Esta deslocação terá acontecido em maio, altura em que o Couço, parecia uma ilha, rodeado por campos de arroz.
 

Estava a pesquisar sobre o nome do Clube que visitamos no Couço - que só pode ter sido a União Desportiva do Sorraia (embora o jogo tenha decorrido na escola primária) que se inscreveu na Federação Portuguesa de Xadrez em 1984 - quando dei com um interessante trabalho  que partilho convosco:

MEMÓRIAS DA RESISTÊNCIA RURAL NO SUL, Couço (1958-1962), Paula Godinho - Dissertação de Doutoramento, Universidade NOVA de Lisboa, 1998.

Percorrendo este trabalho dei com interessantes referências testemunhais sobre as práticas lúdicas de xadrez nas prisões politicas portuguesas, que partilho convosco.

O dia de sábado era dedicado a uma actividade mais lúdica. (…) havia até quem jogasse o xadrez. Isto em todas as cadeias, havia em Peniche e em Caxias também, havia até campeonatos de xadrez. Faziam-se as peças com pão. Pessoas habilidosas, com o miolo do pão que eles distribuíam. 
Arménio Marques Gil
 
Fortaleza de Peniche


“Só visto, e o coração lá dentro: uma vez estava a jogar ao xadrez mais o Zé Victoriano. Estávamos a jogar, e estávamos assim mais um bocadinho retirados da porta. Diz assim o guarda: «Os senhores, se quiseram jogar ao xadrez venham aqui para o pé da porta, que aí não jogam». E o que é que a gente pensou: «Então, se só jogamos aí ao pé da porta, já não jogamos». «Então já não jogam?» «Não»(...) Muitas coisas destas, e o coração estava sempre em primeiro lugar.”  
António Oliveira

Saber mais em:
http://doportoenaoso.blogspot.pt/2010/08/o-porto-onde-nasci-e-cresci1.html
https://run.unl.pt/bitstream/10362/3600/1/paula%20godinho.pdf